quarta-feira, 3 de junho de 2009

O Império das Fabulações



Neste ano tive a oportunidade de conhecer o Pensamento do Geógrafo Milton Santos e de fazer a abertura do VIII Encontro Nacional e I Encontro Internacional com o Pensamento de Milton Santos, que se realizou em Natal no IFRN e na UFRN. Abaixo segue o texto que escrevi e que interpretei nesta abertura.




O Império das Fabulações
O pensamento de Milton Santos por Rodrigo Bico

Personagem Aristocrata Clownesco

(entra distribuindo bexigas para o público, com uma ação de encantamento, numa atmosfera onírica, enquanto realiza esta ação discorre o texto abaixo)

Senhoras e Senhores sejam bem vindos ao maravilhoso mundo da vida, do avanço tecnológico, percebam o quão belo encontra-se o mar, o céu azul repleto de pássaros que voam onipotentes, livres, assim como a humanidade, que é livre e que age fervorosamente para que vivamos nesse mundo tal qual como nós vemos. Quem aqui não é livre para atravessar os mares, os oceanos? Quem aqui não é capaz de ver as maravilhas modernas criadas pela pós-modernidade. A humanidade avança a passos longos e bravios, a livre iniciativa e o livre comércio fazem com que sejamos capazes alçar vôos inimagináveis!
Ah! Como é belo ver que um em um milhão consegue o sucesso, a fama e o dinheiro, esse é um herói, um mito, uma lenda! Pois ele é somente UM, unicamente UM, um exemplo a ser seguido, a ser idolatrado.
Eu sou fruto da minha livre iniciativa! (Grita e deixa de entregar bolas)

Eu, somente EU!!! (ri exageradamente [1º sinal de esquizofrenia])

Eu fui capaz de negar toda a minha territorialidade, cuspir em meu povo, queimar toda a minha história e avançar! Rumo ao triunfo econômico e social, e vejam alcancei o mais alto degrau da fama. Adentro no mercado onissapiente e integrador da humanidade por meio do livre-comércio. Ah! Como eu deliro com tudo isso!

Adentramos no fantástico Mundo das Fabulações, num mundo encantado. Troco, diariamente, sacos de cimento por árvores. Pobres me chegam aos montes, pedindo encarecidamente sacos de cimento para as suas construções, e eu diariamente faço doações generosas de sacos de cimento às populações pobres e necessitadas. Aplaudam-me!!! Por favor, aplausos!
(Eloquente) No Próximo ano doarei milhares de canoas para as populações assoladas pelas enchentes, e enquanto faço isso outras populações inteiras vibrarão com minha atitude e me chamarão de herói e me transformarão num Mito!!! Quero aplausos! Muitos aplausos!!!

[2ª sinal de esquizofrenia]
(ri como se estivesse em estado de gozo olhando para a platéia)

Brasil abra sua porta para os avanços da perversidade humana! Abra o seu mercado, diminua o seu estado, precisamos do desemprego para alimentar nossas fabulações, o povo necessita da pobreza como naturalidade, do carnaval como letargia, do futebol como religião. (cantando e dando camisa da seleção brasileira)

O samba a gente não perde o prazer de cantar
E fazem de tudo pra silenciar
A batucada dos nossos tantas
No seu ecoar, o samba se refez (...)

[3ª sinal de esquizofrenia]
Está aberto o maior leilão da perversidade humana! Preparem suas apostas, suas ações e seus bolsos! Hahahahaaaa!
Enquanto milhares de cidadãos bondosos e preocupados com a nossa flora, com a nossa respiração, plantam pequenas árvores em seus quintais tão enfeitados de flores e de afetos, tão mimeticamente tratados, com um amor essencial aos humanos solitários, Eu! Eu abro o leilão de pedaços valiosos de terra com uma mata atlântica virgem e pronta para ser edificada a sua moradia saudável e próxima da natureza, e logo abaixo está presente toda a marginalidade pronta a receber nosso carinho assistencial!!!
Está aberto o Grande Leilão do Morro do Careca! Isto mesmo, nosso maravilhoso cartão postal pode agora ser seu e de seus amigos globalitários! Lá iremos fazer imensos banquetes que só a nossa globalização pode nos dar e os pobres não serão convidados! Porque quando são naturalmente excluídos apenas fabulam e sonham em ser convidados! A eles, restarão acompanhar como serviçais, será lindo vê-los fazendo nossos quitutes, servindo nossos drinques e pedindo para tirar fotografias conosco, pois somos os seus heróis, somos o alimento de suas fabulações!
Pois bem! Apostem, a aposta inicial de 100m² de terra sai pela bagatela de... de... de... 200 mil reais!
(Jogo com a platéia)



[4º sinal de esquizofrenia]
(risos frenéticos e incontroláveis o fazem tirar a roupa)
O que é? Por que me olham? Vocês para mim não passam de uma medíocre parte dos letrados brasileiros! Vocês amontoam-se sobre seus livros e se acham verdadeiros intelectuais! E neste mesmo momento que vos falo, me olham com ar de reprovação, (grita) não me venham dizer que existe uma transição em marcha! Não me venham falar que está por vir uma reconstrução do arcabouço político-territorial do país a serviço da sociedade, da população! As pessoas não querem saber disso, elas nem sonham com isso. Minha perversidade é letal e tenho a tecnologia única e eficaz sobre o meu controle, acredito na prevalência do dinheiro em estado puro como motor primeiro e último das nações, enxotaremos toda a pobreza em territórios de subsistência, ergueremos a fantástica muralha do capitalismo!!!
Não me falem que existem 2/3 de pessoas que não dormem porque sentem fome, e 1/3 de pessoas que não dormem por medo dos que sentem fome.
Agora vos lanço um desafio: quem aqui não dorme porque sente fome? Vamos falem! (Jogo com a platéia) Levantem os braços aqueles que não têm o que comer... hahahaha!!! Estão vendo, e levantem agora os braços os que tem medo dos que tem fome?

(realiza uma pequena gag sem conseguir abaixar os braços, seus braços ficam tesos para o alto e ele tenta baixá-los após realizar esta ação começa a falar o texto abaixo quase que em convulsão)

Parem! Eu não sou um desses. Eu durmo tranquilamente por doar sacos de cimento às populações pobres que derrubam árvores, eu durmo tranquilamente por doar canoas aos necessitados das enchentes, eu durmo por minha mulher doar mosquiteiros às populações e adota negros africanos. Eu não sou um desses! Não me venham com esse papo de revanche dos territórios, não me venham com falsos aforismos! Não me venham dizer que sou um esquizofrênico, que o espaço que crio torna-se esquizofrênico! O meu mundo é perfeito, para mim o meu mundo é perfeito para mim, para mim, para eu fazer minhas esquizofrenias! Para eu fazer minha esquizofrenias! Parem eu já não agüento mais vocês! Vocês não vão conseguir me destruir! Quando menos imaginarem tornarei o Mundo em mais um Império de Fabulações!

(Corpo congela no espaço, aparência desgastada, com roupas e maquiagens, respiração ofegantes, desconstrução e distanciamento do personagem)

Eis que me encontro frente a vocês e me pergunto: E se fosse diferente? Isto eu não farei aqui nem vos responderei, vou para o mundo real e perverso enfrentá-lo, na esperança de que vocês façam a vossa parte. Aqui está o exato ponto onde os caminhos se Bifurcam.

(sai e volta puxa uma das pessoas que estavam com a bola)

Se vocês estourarem essa bola de ar, verão a verdadeira perversidade que existe na beleza das coisas.

(estoura bola cheia de farinha sobre a cabeça da pessoa e sai)

3 comentários:

Anônimo disse...

Eu, que não sou um apreciador da "arte" e da "cultura" (conceitos amplos e mutáveis - não cabe uma discussão aqui), fiquei extremamente "sem palavras" diante de sua apresentação.
Parabéns e, mais uma vez, desculpe-me por não acertar mexer naquele maldito notebook. =)

abraços,

Paulo Emílio

Unknown disse...

Parabéns compa!!!! Fantástico, como sempre!

zoraia disse...

Rodrigo, sou aluna da Universidade Federal do Ceara e tive o prazer de assistir sua apresentacao no evento de comunicacao comunitaria, dia 11, na UFRN. Foi incrivel! Um dakeles momentos que vc agradece por estar vivenciando. Sua fala no painel tb foi maravilhosa! Super parbens! Quem dera morar em Natalpara acompanhar o trab de vcs! Abr. Zoraia